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Autoconhecimento

Ser VIP. Isso é very important mesmo?

Momento mundial é ideal para revermos prioridades e conceitos. Mas será que estamos fazendo isso?

 15 de setembro de 2020
7 min de leitura

Ser VIP. Isso é very important mesmo?

O CEO do Facebook, dono de uma fortuna que supera os US$ 100 bilhões, só veste calça jeans e moletom, dirige carros que custam em média US$30 mil e foi visto comendo no McDonald’s, durante  sua lua de mel na Itália.

Assim como Zuckerberg, outros tantos bilionários, coincidentemente do mundo da tecnologia, também não esbanjam  fortunas, nem as exibem para facilitar seus negócios e conquistas.

Biz Stone, um dos fundadores do Twitter, tem um Volkswagen Golf amassado que vale US$ 20 mil; o CEO fundador da Tumbir, David Karp, leva uma vida pra lá de simples: o seu maior gasto foi a compra de apartamento de US$ 1,6 milhão, que tem a metade do espaço vazio, porque não possui objetos suficientes para preencher sua casa.

Outros tantos poderiam ser citados, mas o que me intriga demais, e eu quero dividir com vocês, partindo dos exemplos acima, é exatamente o contrário.

Por que existem tantos milionários, bilionários, e até pessoas que não deveriam se considerar tão ricas assim, que adoram mostrar seu poder de compra, ou melhor, de esbanjamento, quase como um fetiche?

Um livro define e explica o que é ser VIP.

Um livro define e explica o que é ser VIP.

A sigla V.I.P. tem significado para muita gente que entende o dinheiro como símbolo de status e poder. E virou sinônimo de privilégio para muitos e muitas, por se encaixarem num padrão de beleza X.

São chamados assim ou se consideram dessa “espécie”, porque foram exclusivamente convidados para este ou aquele lugar, evento, festa, jantar, e o que mais for essencial para fazer parte do cenário e ajudar a alimentar o ego, o narcisismo e os negócios de poucos e bons (como geralmente eles pensam de si mesmos).

É triste, mas tem sido assim, cada vez mais.

Ser VIP é se destacar dos demais. Ser VIP é ter algumas vantagens advindas de sua presença evidentemente rica, ou de uma estética esplendidamente bonita.

O livro Very Important People, de Ashley Mears, traz algumas referências que ajudam a definir o mundo dessas “pessoas muito importantes”, significado da sigla em português.

Mears fez uma pesquisa bastante interessante sobre os chamados VIPS, ao frequentar as noites e lugares badalados, de Cannes a Los Angeles, acompanhando um grupo seleto de modelos e influencers. Ela soube aproveitar a oportunidade para alimentar  sua carreira acadêmica.

Esse trabalho demandou muitas perguntas e algumas surpreendentes respostas: Por que, ou mesmo como, um milionário gasta mais de US$ 100 mil, muitas vezes US$ 1 milhão, em uma boate em uma única noite?

Esse não é apenas um comportamento extraordinário, mas acontece num pequeno mundo de estritas portas fechadas. O circuito global de festas é onde o 0,1% pode se exibir, e ninguém mais. Seguranças, taxas de entrada e locais exclusivos impedem muita gente de testemunhar tal desperdício extremo.                                                   

Ashley Mears, assim como centenas de jovens (geralmente de 16 a 25 anos), magras e altas (pelo menos 1,75 m sem salto e mais de 1,80 m com ele), normalmente, embora não exclusivamente brancas, eram escaladas por promotores pagos pelas boates para trazer esse conjunto de moças bonitas até as festas, pois elas atraem milionários e bilionários como mariposas para a luz. E o resultado do “esforço” para esses locais é fruto do investimento que elas inspiram em  homens tão, tão….gastadores. Os ricos, argumenta a autora do estudo, ao gastarem em mesas VIP e champanhe, “perdem muita riqueza, mas ganham reconhecimento entre seus pares”.                                           

Na verdade, existe toda uma indústria criada para capitalizar esse ritual. Dos promotores ao champanhe, as empresas exploram a insegurança, segundo Mears, em seu próprio benefício.

Gastar é um esporte com espectadores. De preferência quantias absurdas, numa mesa cheia de garrafas e mulheres ao redor. Isso é o que destaca esses chamados VIPs nas redes sociais. “Os clientes têm menos probabilidade de gastar, se estiverem rodeados de meros civis”, observa Mears, referindo-se ao jargão da noite para pessoas que “não são bonitas nem ricas o suficiente”.

Este é o “capital feminino”, ela completa. Essas moças não são para sexo ou amizade, “com capital feminino, celebridades podem festejar com executivos e jantar com bilionários. Os clientes desses locais, aproveitam o  ‘capital feminino’ para alavancar convites para outras festas onde podem realizar negócios para mais enriquecimento financeiro.”

Hora de repensar o que é ser VIP.

Enfim, voltando à atual situação mundial de combate ao Coronavírus, onde não se permite aglomerar, principalmente nesses espaços de tanto interesse dos endinheirados, o conceito importante, intrínseco à palavra VIP, é exatamente o que deveria ser repensado agora, na minha opinião. Ser importante…. é ser para alguém ou para algo, concorda?

Em tempos de pandemia, de tantas perdas, de tanto sofrimento, de várias  teorias ainda atrasadas acerca do que é ser rico, e da evidência das nossas famigeradas diferenças de gênero, raça, credo e classe, está mais do que na hora de reavaliarmos definições como essas.

Títulos vazios como VIP nos separam, nos desumanizam, destroem a nossa capacidade de sermos solidários, justos e éticos. Impõem-nos divisões e distanciamentos que exatamente, agora, não deveriam existir.

Parece que esse vírus veio nos colocar exatamente nesse lugar de pensar melhor, de refletir, de nos protegermos de nós mesmos. Uma ótima oportunidade de usarmos  nossa capacidade de entender o que deve ter e ser valor para melhorarmos como humanos.

Eu ainda acredito que a gente pode vir a ser V.I.P, sim, mas de um outro jeito: very incredible people. E ao que parece, teremos tempo para aprender e merecer esse título.

Você, eu e muitos outros, podemos ser very incredible people fazendo o melhor pelo outro, respeitando os protocolos e o próximo, protegendo-se, não aglomerando, cultivando a paciência e a solidariedade, participando de campanhas voluntárias, enfim, sem negacionismos, sem extremos, com consciência e saúde para seguir em frente, porque não é só o dinheiro que faz a gente ser feliz.

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Rê  Spallicci