Entenda o que caracteriza o assédio moral e como lidar com esta situação
Estamos passando por um momento de profundas mudanças nas relações de trabalho. Cada vez mais pessoas têm uma relação trabalhista diferente daquela que vivenciamos nas últimas décadas. Profissionais que trabalham a partir de suas casas, contratos intermitentes, enfim, uma série de alterações consolidadas na reforma trabalhista que tornam a relação empresa-profissional bastante distinta.
E na esteira dessas mudanças, acompanhamos também uma maior preocupação das organizações em garantir relações mais saudáveis entre líderes e liderados, baseadas em princípios mais éticos e de respeito mútuo.
Como ontem foi Dia do Trabalho, quero aproveitar a data para falar de um tema superimportante que a cada dia ganha mais foco dos meios de comunicação e das empresas, e que faz parte deste contexto que citei acima: o assédio moral.
Que é o assédio moral?
Muito se tem falado do assédio moral, mas o que realmente caracteriza o ato? Conversando com minha amiga Leila Santos, advogada especializada no tema, ela explicou que a Constituição Federal assegura o direito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas. E, sempre que ocorrer uma violação a esses direitos, é-lhes assegurado o direito à indenização por dano material ou moral. “Nas relações de trabalho, o tema também é tratado na CLT, que estabelece que devem ser preservadas a honra, a imagem, a intimidade, a liberdade de ação, autoestima, sexualidade, lazer e integridade física dos trabalhadores.”
Mas a linha entre o que pode caracterizar situações comuns, muitas vezes incômodas, mas inerentes à convivência no ambiente de trabalho, e o assédio moral em si é muito tênue e complexo de distinguir. “Mas o Tribunal Superior do Trabalho foi feliz em uma decisão, ao dizer que o assédio moral se configura quando ‘há excesso ao razoável, por parte do empregador, que atente contra a dignidade da pessoa humana.’” .
As situações em que as pessoas se excedem e podem caracterizar o assédio moral são inúmeras, mas podemos citar como exemplo: i) o isolamento de um funcionário que é retirado das atividades rotineiras e passa a não fazer mais parte dos trabalhos corriqueiros que estava acostumado a fazer – um dos objetivos mais comuns desta prática é forçar a pessoa a pedir desligamento; ii) o trabalho incompatível com o que foi combinado no momento da contratação e/ou com o nível de especialização do empregado; iii) o rigor excessivo em relação a determinado empregado em relação aos demais; iv) o excesso de tarefas forçando à exaustão e a alegação de baixo desempenho do empregado; v) brincadeiras inapropriadas; vi) missões impossíveis; vii) comentários negativos em público – o bom gestor reconhece em público e corrige em particular; viii) discriminação de qualquer natureza; ix) assédio sexual.
Assédio moral x pressão
Cada vez mais, as empresas trabalham com equipes enxutas, e a atual crise econômica pela qual o País ainda atravessa, torna os ambientes das empresas mais tensos e com mais pressões por resultados. Mas isso por si só não pode ser considerado assédio moral. Segundo a Leila, a linha, mais uma vez, é bastante tênue, mas o que distingue uma coisa da outra é a preservação da dignidade da pessoa humana. “O empregado pode ser cobrado pelo resultado do trabalho, mas isso não pode ofender sua dignidade. Desse modo, os resultados cobrados devem ser razoáveis, não pode haver rigor excessivo exclusivamente a um empregado, a cobrança não pode ser vexatória ou pública, e as tarefas atribuídas não podem ser impossíveis de ser executadas”, explica.
Nem mesmo as jornadas de trabalho excessivas podem ser consideradas assédio moral. Pois, segundo o Tribunal Superior do Trabalho, isto não configura o chamado dano existencial, que nada mais é que um tipo de dano moral, que se caracteriza quando a pessoa é privada do direito a sua vida intima, do convívio com familiares e amigos, por causa da prorrogação corriqueira de sua jornada de trabalho. “Para que se configure o dano, é preciso que haja prova de que, de fato, a jornada excessiva provocou essa ruptura do direito à intimidade e à liberdade do individuo. Se comprovado, certamente estaremos diante do chamado dano existencial e da necessária reparação.”
Assedio moral será crime
Uma das principais mudanças pela qual a questão do assédio moral deve passar é a criminalização do ato. “O projeto de Lei 4.743/01[1] cria o crime de assédio moral no trabalho. Apesar de ter sido apresentado em 2001, o projeto foi colocado à votação e aprovado pela câmara dos deputados e, para entrar em vigor, precisará da aprovação do senado federal e da sanção presidencial. Portanto, é preciso aguardar estes passos e se, de fato, se materializar, o assédio moral no trabalho passará a ser crime.”
Na prática, a pessoa que “Ofender reiteradamente a dignidade de alguém, causando-lhe dano ou sofrimento físico ou mental, no exercício de emprego, cargo ou função” responderá por crime, cuja pena será de um a dois anos.” Neste conceito não importa a relação hierárquica, qualquer pessoa poderá responder pelo crime, seja em relação a um funcionário que responda para o agressor, seja entre pares ou até do liderado em relação ao líder, o que é mais raro, mas pode ocorrer. Uma condenação desta natureza certamente não levará uma pessoa a cumprir pena efetivamente, inclusive porque admite uma espécie de acordo com o ministério público, mas certamente a mácula de ter respondido a um processo criminal causará um considerável dano ao profissional, por uma ação desta natureza.
As empresas e o assédio
Para as empresas, a questão do assédio moral é muito séria e pode causar diversos efeitos, desde a exposição negativa de imagem, até altos índices de absenteísmo e afastamentos por doenças psicológicas decorrentes do trabalho. Por isso, muitas são as organizações que estão investindo em robustos programas de Compliance que, dentro de seu escopo, recebem, inclusive, denúncias de assédio moral e garantem aos empregados que não haverá retaliação em caso de reportes.
Do lado do profissional, não praticar atos de assédio moral é algo que deveria ser extremamente normal, já que, de forma simplificada, tudo se resume ao respeito ao outro. ”É preciso respeitar o outro, pensar como se sentiria se fosse você ou uma pessoa da qual gosta muito na posição da outra pessoa. Obviamente, podem ocorrer situações em que o empregado força a situação para caracterizar o assédio moral. Em tais situações, é preciso frieza, sempre se cercar de outras pessoas que podem comprovar a forma respeitosa com que trata o outro. É importante que o trabalho seja saudável para todos.”
É importante lembrar que doenças psíquicas são hoje as maiores responsáveis por afastamentos no trabalho, e o assédio moral praticado de forma contínua por profissionais mal preparados e inescrupulosos podem desencadear depressão, síndrome do pânico, burnout (saiba mais sobre esta síndrome neste texto: Sempre cansado? Cuidado! Você pode estar com a síndrome da exaustão – burnout!), entre outras doenças.
Por isso, a minha intenção com este artigo é esta: alertar a todos sobre a importância de um ambiente de trabalho agradável e sadio para profissionais e empresas! Afinal, passamos mais horas no trabalho do que com nossa família, e esses momentos não podem ser um suplício e muito menos algo tóxico para nossa saúde mental.
Que possamos comemorar nos próximos dias do trabalho ambientes mais agradáveis, diversos e motivadores para todos nós!
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Rê Spallicci