Ortorexia. Saiba tudo sobre este transtorno alimentar,
Na última semana, estive no programa Papo de Almoço, da Rádio Globo, da querida Adriane Galisteu. Foi uma delícia! Uma conversa supergostosa e descontraída. Pude compartilhar minha história, falar do meu livro, Do Sonho à Realização, e do trabalho que desenvolvo para empoderar as pessoas a terem uma vida mais saudável, plena e repleta de realizações.
No programa estavam também o psicólogo do Ambulatório de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria (HC) da Faculdade de Medicina da USP (AMBULIM), Fellipe Augusto de Lima Souza, e a jornalista e influenciadora digital Mirian Bottan, que, após viver anos com problemas causados pela alimentação, hoje trabalha para conscientizar as pessoas sobre esses males.
Ambos participaram do programa para falar sobre transtornos alimentares, e aprendi muito com eles.
Primeiramente, quando falamos sobre o tema, logo pensamos em bulimia e anorexia, que são os mais comentados na mídia, mas há outros tipos de distúrbios menos conhecidos e que também são superperigosos.
Um que me chamou atenção foi a ortorexia, uma doença que eu nem imaginava que existia. O transtorno é caracterizado pela obsessão por comer saudável! Fiquei muito preocupada quando soube do que se tratava e o quanto pode afetar muitas pessoas, principalmente em uma época como a que vivemos na qual estamos sendo buscando opções mais saudáveis para nos alimentar! Até que ponto isso é realmente bacana e quando se torna um distúrbio? Quais os riscos que esse transtorno pode trazer? E é exatamente para alertar a respeito deste risco que resolvi escrever sobre esse assunto para vocês.
Da bulimia à ortorexia
Antes de mais nada, deixa eu contar para vocês um pouco sobre a história da Mirian Bottan.
Ela sempre foi uma menina bonita. Desde os cinco anos, participava de concursos de beleza infantis. Isso foi criando nela, desde muito cedo, uma relação com o corpo e a aparência física de algo que lhe proporcionaria premiações ou derrotas.
Aos 11, ela deixou de participar dos concursos, mas a relação com o corpo já estava formada. Aos 13, ganhou uns quilinhos e começou ficar super na neura de engordar. E nesse momento, uma matéria ia transformar a vida dela… e para pior.
“Era uma matéria sobre um menino que tinha bulimia e que, para não engordar, vomitava. Ele quase havia morrido por causa desse mal, mas eu só me concentrei na fórmula que ele usava para não ganhar peso… E pensei que aquilo podia ser uma boa ideia”, ela me conta.
Então, aos 13, a Mirian começou a ter episódios de comer desesperadamente e depois vomitar… um problema que a perseguiu até dois anos atrás, quando ela já estava com 28 anos!
“Toda a minha vida foi marcada e direcionada por essa compulsão. Cheguei a pesar 38 quilos, perder cabelo… um inferno”, revela.
E, ao longo desse verdadeiro martírio pelo qual passou, além da bulimia, a ortorexia também fez parte de suas compulsões.
O que é ortorexia?
Segundo o Fellipe Augusto, a ortorexia é um dos novos transtornos alimentares. Nesse caso, o paciente se engaja no comer saudável, não somente para perda de peso, mas para não contrair algum tipo de doença. “As pessoas ficam obcecadas pelos alimentos, verificando cada substância que eles contêm, comendo-os como se fossem remédios para prevenir grande parte das doenças que imaginam que podem ter. O problema disso é que elas começam a restringir a alimentação de forma significativa e acabam ficando presas a um grupo específico de alimentos, tendo um incrível prejuízo nutricional.”
E foi o aconteceu com a Mirian, em um período da sua vida, segundo ela me confidenciou. Em tratamento para a bulimia, parou de vomitar e de ter as crises de compulsão, mas passou a ficar obcecada por alimentos saudáveis, usando a fórmula também para se manter magra.
“Esses pacientes têm muitas consequências clínicas, tendo baixos níveis de vitaminas, minerais, potássio, entre outras substâncias. Acabam sofrendo perda social, pois os alimentos que comem não estão disponíveis em qualquer lugar e passam horas do dia procurando os que julgam ser saudáveis”, relata o psicólogo.
Mirian se lembra de uma ocasião em que estava viajando com o namorado e teve altas brigas com ele porque queria sempre comer coisas saudáveis e, com isso, as refeições eram sempre um motivo de discussão entre eles. “Eu, em um lugar maravilhoso, e só preocupada onde conseguiria comer comida saudável.”
A pessoa ortoréxica inicia uma busca obsessiva por normas (ou regras) de alimentação saudável. As informações são obtidas por intermédio dos meios de comunicação, mas que são distorcidas e, muitas vezes, exageradas. Dessa forma, ela acaba excluindo muitos alimentos. Começam com aqueles considerados impuros, como corantes, conservantes, gorduras trans, açúcar, sal, agrotóxicos, pesticidas, alimentos transgênicos, entre muitos outros, até a exclusão de grupos de alimentos considerados importantes para uma nutrição adequada, podendo chegar a quadros de carências nutricionais ou subclínicos (fome oculta, déficit de vitaminas e micronutrientes, anemia, osteopenia, entre outros).
O ortoréxico também associa uma preocupação com a forma de preparo e os utensílios utilizados na preparação dos alimentos. Por isso, comer fora de casa é considerado um problema… Aí, evitam reuniões sociais e jantares para não “cair na tentação” de ingerir outro tipo de produto. Sentem uma sensação confortável ao prepararem um prato elaborado exclusivamente com produtos orgânicos, ecológicos, bio ou com determinados certificados de salubridade.
Acabam se isolando para conseguir se alimentar dessa forma saudável ou com alimentos considerados “puros”, em casa, não aceitando comer em restaurantes e, dessa forma, acabam deixando de sair com os amigos ou namoradas/os. A dieta “saudável” acaba tomando conta de sua vida.
Como identificar transtornos
Transtornos alimentares são, na verdade, problemas psicológicos e, não raro, bastante difíceis de serem diagnosticados. E a ortorexia, em especial, é ainda mais complicada, porque a pessoa pode parecer, para os demais, que é alguém somente preocupada com a saúde.
Entretanto, a pessoa pode perceber que está tendo um transtorno alimentar quando grande parte do dia dela gira em torno de comportamentos para a perda de peso ou para manter aquele hábito, não conseguindo mais se concentrar no trabalho ou estudo e até mesmo se esquivando de eventos sociais, por ter receio de serem obrigadas a comer.
Muitos são os gatilhos que podem levar às compulsões e transtornos, e cada pessoa tem algum específico que precisa ser descoberto em sessões com psicólogo, mas, de forma geral, podem ser: estresse interpessoal, conflitos familiares, comentários relacionados ao corpo, autojulgamento, crítica elevada sobre seu peso, dificuldade de expressar sentimentos, entre outros.
Fellipe Augusto ensina que os transtornos alimentares são caracterizados por uma perturbação persistente no comportamento alimentar, acarretando prejuízo à saúde física, emocional e social. “Em casos como Anorexia e Bulimia, como o paciente apresenta uma distorção da imagem corporal e/ou uma insatisfação corporal elevada, acaba se engajando em comportamentos disfuncionais para obter a perda de peso, como: uso abusivo de laxantes/diuréticos, contagem de calorias, pesagens diversas vezes ao dia, dietas extremamente restritivas, purgações, exercícios físicos excessivos, entre outros métodos compensatórios. Na compulsão alimentar, esses pacientes apresentam uma perda de controle na ingestão dos alimentos, associada a uma culpa, vergonha e frustração, logo após o episódio de compulsão alimentar.”
Para explicar melhor a compulsão alimentar, o Fellipe, que é também pesquisador na área de Transtornos Alimentares, tendo prêmios e publicações científicas sobre tratamento, e professor dos cursos de especialização em transtornos alimentares para médicos e psicólogos do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, dá o seguinte exemplo:
Ela pode ser uma consequência de grandes períodos de restrição alimentar e, em alguns casos, os pacientes não lembram do que ocorreu, tendo um episódio dissociativo, percebendo somente horas depois, quando entra na cozinha e veem vários pacotes de alimentos abertos, suas mãos e roupas sujas.
Como tratar
O tratamento para os transtornos alimentares é realizado em conjunto, entre psicólogos, psiquiatras e nutricionistas especializados.
Depende muito da gravidade do caso. Grande parte dos pacientes tem uma remissão parcial e até total dos sintomas, mas precisa sempre ficar alerta, pois esse será sempre o seu ponto fraco e “calcanhar de Aquiles”.
O tratamento dependerá do comprometimento do paciente com a psicoterapia, focando nos comportamentos e problemas, seguindo o acompanhamento nutricional e, em alguns casos, tomando a medicação prescrita pelo psiquiatra”, me explicou o Fellipe.
Ajudando outras pessoas que passam pelo mesmo problema
Depois de conviver tantos anos com seus transtornos alimentares, hoje, a Mirian se dedica a levar informações para as pessoas sobre esses problemas, por meio de um grupo de apoio no Facebook, Precisamos Falar, e seu perfil no instagram, @mbottan, e dá palestras e entrevistas sobre o tema.
“As pessoas precisam entender que transtorno alimentar é algo muito sério e que pode levar à morte. E antes de tudo, precisam se aceitar como são e não buscar um padrão de corpo perfeito, idealizado e imposto pela sociedade e pela mídia.”
Eu, por ser uma atleta profissional, tenho uma alimentação hiper-regrada, mas sempre com acompanhamento médico e nutricional! E, em todas as minhas matérias sobre dieta e exercícios, sempre faço questão de reforçar a importância de termos saúde, física e psicológica, antes de qualquer preocupação estética.
Somos mais que nossos corpos, somos essência acima de tudo e não há corpo bonito que justifique o sofrimento de alma imposto por restrições muito severas. Lembre-se, todo transtorno alimentar tem muito a ver com a necessidade que temos de ter controle sob algo, nesse caso, a aparência física. Mas a verdade é que a vida é baseada no caos, e tudo o que podemos fazer é tentar um pouco de equilíbrio por meio do autoconhecimento, da compaixão e da gratidão.
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Rê Spallicci