De presidente de escola a fundadoras de blocos, mulheres vão buscando protagonismo
O Carnaval está chegando… E eu contando os dias para debutar na Avenida como Rainha da Barroca. E quanto mais eu entro para este mundo, mas vou conhecendo como funcionam os meandros das escolas e da organização dessa festa tão maravilhosa e apaixonante.
E algo que atraiu a minha curiosidade foi saber como se dá a participação das mulheres nos cargos diretivos das escolas de samba. Afinal, no mundo corporativo, por exemplo, há uma preocupação constante em se buscar o aumento da liderança feminina em um cenário de desigualdade ainda bastante latente, mas… E no carnaval, qual o cenário?
Participação ainda tímida
Se na comunidade a gente pode dizer, empiricamente, que a participação nas escolas é bem igualitária, nos cargos diretivos das escolas a proporção ainda é desigual. Porém esse panorama vem mudando pouco a pouco.
Das 14 escolas do Grupo especial, quatro delas são presididas por mulheres: Tom Maior, Pérola Negra, Mocidade Alegre e Rosas de Ouro. Temos ainda uma vice-presidente, na minha Barroca, e mais 11 mulheres em cargos de diretoria.
É ainda uma participação tímida, mas que já demonstra uma mudança de mentalidade em um mundo que até bem pouco tempo era totalmente liderado pelos homens.
“Fui criada no samba, mas não é fácil. Todo ano é um novo desafio. Sempre sou mais desafiada por ser mulher”, diz Angelina Basílio, a comandante da Rosas.
Solange Bichara, da Mocidade Alegre, uma das mais experientes, conta que também tem que se impor mais por ser mulher. “Eu me imponho. Sou tinhosa. Antes, se gritavam na Liga, pediam desculpas por ter mulher. Mas eu grito de volta”, conta.
Luciana Silva, a mais jovem do trio, sabe que já foi mais difícil ser mulher no samba:
“Eu tive referências a seguir. Não é fácil, o carnaval era muito masculino. Mas as mulheres foram chegando e conquistando seu espaço. Angelina e Solange devem ter sofrido mais”, complementa.
Nos blocos elas também dão as caras
No entanto, não é somente no carnaval da avenida que as mulheres vão conquistando seu espaço. No carnaval de rua, onde nos últimos anos houve uma explosão de blocos, nós também estamos buscando o nosso protagonismo.
Hoje, São Paulo conta com uma infinidade de blocos criados por mulheres e que levam as bandeiras das causas femininas à festa. Um deles é o Pagu, que entoa clássicos de vozes femininas da música popular brasileira, e conta com 150 mulheres na bateria.
Foi fundado em 2016 por duas amigas, Mariana Bastos e Thereza Menezes, que perceberam o vácuo de representatividade feminina no Carnaval. Em blocos mais antigos, as mulheres ficam com os instrumentos mais leves, como o chocalho. No Pagu, há 30 delas tocando o mais pesado deles, o surdo.
Outro bloco de destaque é o Siga Bem, Caminhoneira, que reúne, sobretudo, mulheres lésbicas e bissexuais, população-alvo de preconceito e boicote à livre expressão ou manifestação de afeto nas festas de rua.
Embora o movimento tenha ganhado novas cores com a chegada de mais blocos feministas, as mulheres ocupam a rua há muito tempo. Fundado em 2005, no tradicional bairro paulistano Bom Retiro, o bloco Ilú Obá de Min (que significa “mulheres que tocam tambor para o rei Xangô”) é um dos mais antigos com bateria feminina – são 450 mulheres, a maioria delas negra. Os seus cortejos homenageiam a cultura afro-brasileira.
As causas dos blocos extrapolaram as fronteiras do feriado, amplificando o grito das mulheres por igualdade e popularizando conceitos como o de assédio. Há alguns anos, atos hoje considerados inaceitáveis, como puxões de cabelo e beijos forçados, eram normalizados dentro e fora do Carnaval. A frase de ordem “não é não” que ajudou a fixar a ideia de que a violência não é mais tolerada, e que a vontade feminina deve ser respeitada, ganhou popularidade exatamente por meio do Carnaval.
Que o carnaval continue sendo um palco democrático de pautas, manifestações e muita diversão. E que nós, mulheres, continuemos cada vez mais ocupando o nosso lugar de direito na Avenida, nos blocos e na sociedade!
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Rê Spallicci